quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Cheiro de terra molhada



Eu não queria ir, mas não sei porque, se me deixava levar. Era um misto de ansiedade, emoção e angústia.

Afinal, eu não sabia o que iria encontrar lá, poderia me decepcionar, mas também poderia desfrutar de uma alegria incomparável, pois poderia voltar no tempo, relembrar os momentos felizes que eu passei por ali. Momentos de liberdade e pura traquinices, folguedos e correrias, sem se preocupar com o tempo, pois ele demorava a passar, como era bom.

Mas, e se eu me decepcionasse? Se eu não encontrasse o que estava procurando? À medida que descia aquela rua, aumentava as batidas do meu coração, estava tudo mudado, no lugar daquelas velhas casinhas de tijolos vermelhos, surgia pédios imensos, condomínios enormes, com muros altos, vigilância, tudo isso fazia dimuir cada vez mais a minha esperança.

Pronto, era só dobrar uma esquina!

Estava lá! Eu não podia acreditar no que via, mas estava lá sim, estava um pouco mudada...o muro...o muro não era mais aquele muro baixinho, sem cercas eletrificadas.

Estava lá e resistia, espremidinha entre enormes prédios, mas eu podia ver de onde eu estava, algumas árvores, frondosas, provavelmente frutíferas. Fui chegando mais perto, e posso dizer que eu sentia aquele perfume, que me levou mais e mais, atrás, na corrente do tempo! Sim, sentia aquele cheiro de terra molhada, pois era tardezinha, uma tarde bem fresca e podia sentir aquele cheiro que me levou de volta a minha infância!

Pulava aquele muro, outrora baixinho, com agilidade de um felino, e adentrava fundo naquele terreiro, passando entre outras árvores de frutas como, manga, carambola, laranja e ia direto, para uma, bem lá no fundo: a jaboticabeira!

Me deliciava com algumas, ali, no pé mesmo, comia até não poder mais, depois colocava a camisa para dentro das calças, e ia colocando mais algumas dentro da camisa, para comer mais tarde! Era uma traquinagem deliciosa!

O dono sabia, quando estava de bom humor, não ligava, mas quando não estava...era perna pra quem te quero, pois ele corria atrás de nós, com uma espingarda de tiro de sal!

E aquele que recebia um tiro desse, quem já levou sabe, ficava dias, as vezes semanas sem sentar!

Era divertido, mas quando escapavamos do dono do terreno, não escapavamos das nossas mães. Quando chegavamos em casa com a roupa toda manchada, dos frutos da jaboticabeira, era muita peia! Mas não tinha importância, estavamos felizes e satisfeitos!

Feliz como estou agora, por recordar um pouco da minha infância, graças a insistência e resistência heróica do dono dessa casa. Sabemos que ela resistira, ainda, por mais algum tempo, mas provavelmente sucumbirá à ganância e especulação imobiliaria, debaixo da desculpa chamada progresso.

Volto para casa satisfeito, por poder ainda sentir um pouco daquele cheiro de terra molhada!

3 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Fui tomada de uma espécie de,"nostalgia alheia".Fui tomada de saudades de coisas que não vive...e gostei.rss

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  3. Seu blog é ótimo.Continue postando, vou sempre visitar.Gostei muito."Aprovado"(kkkkkkkkkkkkkkk)

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